sábado, 26 de janeiro de 2013

SABES O QUANTO VALES?


            Desde muito tempo atrás, em período que remonta ao início da civilização, os homens estabeleceram regras para a divisão do trabalho em uma sociedade, utilizando a moeda como instrumento mediador dos interesses.
            Esta prática milenar, que chegou aos dias atuais travestida sobre as mais diferentes formas de contrato, regula em âmbito mundial as relações entre pessoas.
            Paradoxalmente, a ideia de estabelecer contratos para regular esta relação, cuja função principal seria o de assegurar os interesses dos envolvidos, promovendo a ordem e a “concórdia”, acabou por transformar-se na causa primeira dos conflitos entre os homens, chegando às raias do assassínio e da guerra.
            Uma observação mais detalhada do assunto nos leva a considerar, sob diferentes ângulos, a forma como estes contratos foram elaborados, os valores éticos e morais envolvidos, as condições de liberdade asseguradas às partes contratantes para fazê-lo, bem como o nível de informação sobre causas,  efeitos e consequências do ato, demonstrando o nível de consciência dos envolvidos, etc.
            Como a gama de relações contratuais é extremamente grande, vamos nos ater, por ora, somente àquelas que, de alguma forma, envolvem questões de vida ou de morte, considerando-se que, ao menos na condição individual, a vida é o bem mais precioso e supremo que alguém pode ter.
            Nas relações tribais a defesa do grupo sempre foi uma das maiores preocupações, fosse qual fosse a sociedade.
            A formação de quadros capacitados para promover a defesa do coletivo, de modo bem simples, era aceita por todos e, de forma voluntária, os jovens se ofereciam para a missão, inclusive como forma de alcançar a emancipação.
            Como o crescimento do número de pessoas treinadas para o combate, a possibilidade de enfrentamento entre os diversos ajuntamentos humanos, pelos mais variados motivos, tornou-se um fato histórico, demandando a cada dia, uma maior profissionalização dos exércitos.
            A guerra, e com ela a escravidão dos derrotados, tornou-se frequente entre as nações e os vencidos passaram a ser considerados espólios de guerra, propriedade (mercadoria) dos conquistadores.
            Como mercadorias, os escravos passaram a ser valorizados por suas qualidades, que iam desde a beleza física, sua capacidade reprodutiva, seu conhecimento intelectual, sua destreza para realizar certos trabalhos ou mesmo pela sua experiência em combate.
            E dizer, aqueles grupos, ou mesmo aquelas pessoas, que possuíam um significativo número de moedas, tinham a possibilidade de comprar escravos e deles dispor conforme a sua vontade.
            A antinomia do sucesso alcançado na conquista, retratada no isolamento dos vencedores, forçou, naturalmente, que cada um, segundo o número de suas moedas, formasse seu exército particular, seus guarda costas, seus centuriões.
            Também, de forma natural, como maneira de assegurar o comprometimento dos escravos com sua segurança, os donos das moedas, cada um à sua maneira, procurava recompensar a lealdade.
            A oferta da liberdade após algum tempo, recompensas materiais ou sexuais, moedas, etc., eram algumas das estratégias utilizadas.
            Estas recompensas, por sua vez, atraíam também outros homens, livres, que ofereciam seus serviços a quem pudessem pagá-los.
            A própria manutenção dos exércitos passou a ser uma questão econômica.
            Aos poucos, a ideia da proteção do coletivo, de forma voluntária, patriótica, foi sendo deixada de lado.
            Diferenciando-se dos gregos, os romanos ofereciam aos estrangeiros a oportunidade de serem verdadeiros sócios numa res pública comum, exigindo deles, como contrapartida, que lutassem pela cidade sempre que se fizesse necessário.
            Os cartagineses, receosos de perder o poder comercial que possuíam, frente a ideia propagada pelos romanos da livre adesão, acabaram por declarar guerra contra Roma.
            O exército de mercenários contratados por Cartago, lançado contra Roma, embora vitorioso em muitos embates, acabou derrotado quando os romanos formaram um exército, sob um comando único que, além das tropas treinadas, soube explorar a volatilidade dos interesses pecuniários dos mercenários.
            Esta vitória sobre Cartago acabou por despertar o interesse através da conquista militar entre os romanos que, após inúmeras campanhas, acabaram por conquistar o mundo conhecido.
            Com o passar dos anos, desgastada por inúmeras campanhas militares, assolada por constantes agressões de suas fronteiras por tribos bárbaras, Roma, a exemplo dos cartagineses, vendo o número de seus jovens ser reduzido drasticamente, viu-se obrigada a contratar estrangeiros para defendê-la.
            Isto maculou de tal forma sua imagem, que o próprio imperador Constantino ordenou a mudança da capital do império para Bizâncio.
            A ideia da profissionalização dos exércitos, com quadros nacionais ou valendo-se de mercenários, passou a ser uma questão puramente econômica.
            Honra e civismo, embora sempre invocada pelo dono das moedas, na prática foi sendo abolida.
            Abraham Lincoln, durante a guerra da secessão americana, assinou naquele país, a primeira lei de alistamento compulsório da União, que a Confederação, do sul, já adotara.
            Como moedas são moedas, a lei facultava o direito a quem fosse convocado e não desejasse correr os perigos da guerra, poder contratar outra pessoa para assumir o seu lugar.
            Constam entre aqueles que pagaram substitutos para que combatessem em seu lugar os nomes de J.P. Morgam, os pais de Theodore e Franklin Roosevelt Ed dos presidentes Chester A. Arthur e Grover Cleveland.
            Esta forma de atuação, que revoltava muitos idealistas, sempre foi acompanhada de críticas contundentes, a ponto de Rousseau, em uma de suas manifestações argumentar que:
            “A partir do momento em que um serviço público deixa de ser a principal atribuição dos cidadãos, que preferem servir com o próprio dinheiro em vez de se engajar ara servir, o Estado está prestes a ruir.”
            De forma tautológica, a própria França imortalizou a “Legião Estrangeira”, dando-lhe características românticas e cinematográficas nos registros das campanhas que realizou no norte da África.
            Nos estados modernos, onde a ideia da profissionalização das forças policiais já é aceita pela maioria das sociedades, começa também a ser discutida a utilização de estrangeiros nas forças armadas, a exemplo da nova Roma, que agora aceita latinos e asiáticos, com vistos temporários, em suas fileiras para combater no Oriente Médio, em troca da promessa da cidadania americana.
            Os jovens universitários estadunidenses não querem arriscar suas vidas para defender petroleiras ou oligarquias árabes, preferindo pagar a outros jovens, do terceiro, quarto e quinto mundos, para lutarem sem seu lugar.
            Nos Estados Unidos, a terceirização das Forças Armadas ganha a cada dia ares inovadores, onde as empresas privadas como a Blackwater desempenham muitas atividades no Iraque e no Afeganistão.
            Organizações privadas realizando tarefas do Estado, principalmente nas áreas da segurança, da guerra e da espionagem, a exemplo dos folclóricos xerifes do western americano, aceitas pelas sociedades onde os indivíduos preferem pagar para não se envolver, só fazem banalizar a violência e desvalorizar ainda mais a vida humana.
            De certa forma, como os donos dos escravos que faziam apostas e se divertiam vendo a luta dos gladiadores, a maioria delas até a morte, hoje somos levados a gozar dos mesmos prazeres, pagando para assistir a uma luta de boxe ou a uma sangrenta exibição do UFC (Ultimate Fighting Championship), tão bem trabalhada pela mídia.
            Analisando outro aspecto de uma relação contratual que envolve conceitos morais sobre vida e morte, estudemos um pouco as questões relativas à compra de bebês.
            Já há muito tempo todos sabemos que existe um lucrativo mercado paralelo para a compra e venda de órgãos para transplantes.
            Quem tem moedas sempre encontra alguém que, precisando delas, concorda em vender um Rim ou outro órgão do qual possa dispor.
            Existem registros recentes de pessoas que concordaram em vender órgãos vitais, o que lhes provocaria a morte, pela garantia de compensação financeira a filhos e entes queridos.
            Mas não vamos aqui abordar este aspecto do comércio da vida que, embora importante, foge à mensagem que desejamos transmitir.
            Vamos falar sobre “fertilização in vitro” e sobre barrigas de aluguel.
            No ano de 1985, o casal William e Elizabeth Stern, impossibilitados de terem filhos, contrataram Mary Beth Whitehead para gerar um filho deles.
            Inseminada com o sêmen de William, Mary Beth gerou uma menina de nome Melissa, a qual, após o parto, recusou-se a entregar.
            Após longa batalha judicial, Mary Beth, que havia concordado inicialmente em receber U$ 10 mil pelo trabalho, mesmo sendo a produtora do óvulo que gerou Melissa, acabou sendo condenada a entregar a criança ao casal Stern.
            Este caso, que causou grande comoção social, deu margem a que se elaborassem salvaguardas contratuais onde, a fertilização in vitro, com óvulo e esperma doados por outros inseridos em um útero alugado, retiram da gestante qualquer direito sobre o bebê que vai nascer.
            Com estas garantias, os donos das moedas que, ao invés de adotar um órfão preferissem gerar uma criança nova, tinham assegurado este direito.
            A fertilização in vitro, ao remover a relação tradicional entre óvulo, útero e mãe, fez com que a gravidez de aluguel tivesse reduzida as possibilidades e riscos legais que cercavam a gravidez por encomenda.
            Atualmente, mães de aluguem, em sua maioria de origens latina e asiática, nos Estados Unidos, recebem algo como 20 e 25 mil dólares por gestação que, acrescidos das despesas com o parto e das “taxas legais” cobradas, podem fazer com que o custo do bebê chegue a 75 ou 80 mil dólares.
            Num mundo globalizado, com um produto tão valioso, a Índia legalizou o comércio da gestação na esperança de atrair clientes estrangeiros.
            Como nenhuma característica genética da mãe de aluguel é transferida para a criança gerada, isto se tornou um grande negócio.
            Lá, uma mulher que se proponha a servir de “barriga de aluguel” recebe algo como 4 e 7 mil dólares, muito mais do que receberia em 10 ou 15 anos de trabalho.
            O custo total para os compradores, raramente ultrapassa os 25 mil dólares, evidenciando uma significativa economia.
            Afinal, moeda é sempre moeda.
            Com o avanço da genética, brevemente teremos uma produção seriada de crianças encomendadas, todas com caracteres definidos previamente, como sexo, cor dos olhos, tipo de cabelo e quem sabe até QI.
            É só questão de tempo.
            A aporia que desponta neste século XXI é tentar equacionar a resposta da pergunta inicial.
            Se não definirmos um valor de hoje, poderemos ser ludibriados amanhã.

Professor Orosco
            

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

ESTE CORPO NÃO TE PERTENCE


A Philip Morris, uma companhia de tabaco que tem ampla atuação na “República Tcheca”, diante de uma iniciativa do governo local de tentar reduzir as despesas médicas advindas dos tratamentos para os efeitos malignos do tabagismo, apresentou um estudo detalhado provando que:
O cigarro mata.
Mata tanto que o governo deveria “reduzir” os impostos e incentivar o tabagismo, principalmente entre os jovens, demonstrando com números uma conta bem simples.
Morrendo mais cedo, apesar dos elevados custos com os tratamentos dos males provocados pelo tabagismo, o governo gasta menos já que economiza com pensões e com aposentadorias além dos investimentos necessários para promover e oferecer qualidade de vida aos idosos.
A economia estimada para o governo Tcheco era algo como U$ 150 milhões/ano.
A poucos dias, um ministro japonês, de 72 anos, reclamou que as pessoas em seu país estão vivendo muito, chegando ao absurdo de viverem mais de 80 anos.
Segundo ele, a economia japonesa não aguenta tanto desperdício, sugerindo que, patrioticamente, seus conterrâneos morram mais cedo.
A Ford, nos anos 70, provou matematicamente aos seus acionistas que, mesmo indenizando as 200 mortes/ano e 200 outras vítimas dos graves danos causados pela falha no projeto do seu carro Ford PINTO, que fazia o carro explodir em casos de colisão traseira, a economia total seria maior do que se precisassem gastar os U$ 11,00 por veiculo para corrigir o defeito.
O ganho seria algo como U$ 100 milhões.
Quem comprasse um PINTO poderia se FORDer, pelo bem da companhia.
Por aqui, tem terras Tupiniquins, o governador do rico estado do Ceará, paga R$ 650 mil para um artista apresentar-se nas festividades da inauguração de mais um, dentre os milhares, de hospitais públicos que ele construiu por lá.
Nem vou falar dos pouco mais de R$ 3 milhões que ele pagou ao “Tenor” em outra ocasião.
Nossa presidente PRESIDENTA anuncia de forma glamorosa a redução da tarifa de energia elétrica, tão necessária ao nosso desenvolvimento.
Modestamente, sequer explicou à população que conseguiu realizar esta proeza sem reduzir a lucratividade das concessionárias e prestadoras de serviços do setor elétrico.
Os pouco mais de R$ 8 bilhões/ano, serão subsidiados pelos cofres públicos, retirados contabilmente do BNDES, via Itaipu, ou de um tal “Fundo sei lá do que” criado para assegurar a estabilidade em momentos de necessidade (principalmente eleitoral).
Isso tudo, sem precisar tocar no assunto das “térmicas”, tidas inicialmente como inimigas do meio ambiente e mais tarde justificadas pela necessidade de consumir o gás que subsidiamos ao governo cocaleiro e ao sucateamento da nossa (não sei se ainda o é) PetrobraZ.
No ano que vem, teremos Copa do Mundo, com direito a bebida nos estádios construídos 201% com dinheiro da iniciativa privada (somos praticamente 200 milhões de consumidores e contribuintes).
Em 2016, teremos Olimpíadas...
Para completar, nosso novo modelo habitacional, em adiantado estágio de gestação, que será oferecido brevemente à população, em substituição ao “Minha Casa, Minha Vida”, racionalizado dos 35m2 por unidade (cada pessoa precisa de um mínimo de 25m2 para morar bem) para pouco mais de l m2 por pessoa ( 2m x 0,5m x 7 palmos de altura ), que talvez se chame “Minha Casa, Minha Morte”, só depende do acordo sobre o número de dias que precisaremos trabalhar a mais para pagar a conta.
Resumindo, entenda e assuma que brevemente vamos todos pro buraco e que ESTE CORPO NÃO TE PERTENCE.

Professor Orosco