quarta-feira, 21 de abril de 2021

O PROBLEMA DO AVESTRUZ


É conhecida a figura metafórica de que o avestruz, enterrando a cabeça em um buraco, procura fugir de um inimigo potencial, da mesma forma que fazem as crianças que, fechando ou cobrindo os olhos, acreditam que não serão vistas pelo bicho papão.

Na prática, o que ocorre é exatamente o oposto, pois de olhos fechados, não enxergarmos o perigo, o que não implica que ele não nos veja.

Hoje, diante desta gigantesca mortalidade evidenciada pelo SarsCov II, em suas múltiplas variantes, desperta a necessidade de nos atentarmos para o fato de que, sendo uma de suas características mais marcantes, o acometimento da micro circulação sanguínea que, à sua vez, implica na possibilidade de alcançar todos os tecidos do corpo humano, inclusive o medular, ósseo, a possibilidade de que ele se mantenha inativo, porém não eliminado, nos corpos sepultados, não pode ser descartada de forma perene.

Assim, a urgência sanitária, a exemplos de pandemias anteriores, recomendaria a cremação de todos aqueles que viessem a morrer em decorrência desta Covid.

Exemplo disso está na reconhecida necessidade de proteger os trabalhadores do sistema funerário.

Ocorre que, estes corpos, à medida que forem se deteriorando no interior da terra, onde foram sepultados, podem através da eliminação de fluídos, contaminar o solo, o lençol freático ou mesmo outros organismos presentes nestes ambientes, transformando-os em um potencial contaminante para os próximos anos, o que fará esta epidemia ressurgir no futuro.

Este problema, ainda que pairem questões de caráter religioso a superar, precisa ser encarado pelas autoridades constituídas, amparadas pela ciência e pela prudência que o momento requer.

Quem defende a solução do avestruz, seguramente são seus predadores ou, neste nosso caso específico, os negacionistas aliados do vírus.


Professor Orosco

SER OU QUERER SER ANALFABETO


Diante de tantas informações desencontradas que vemos publicadas diuturnamente tanto nos periódicos impressos, digitais, ou mesmo nas redes sociais, não é de se estranhar que uma grande confusão se instale na cabeça daqueles que, por mais preparados que estejam, veem sua capacidade depurativa e crítica ser solapada diante de tantas notícias falsas ou falaciosas.


Não é de se estranhar que ideólogos, tanto aqueles de matizes de direita quanto aqueles de matizes mais à esquerda, sejam uníssonos em propagar uma certa censura aos meios de comunicação, e da própria academia,  como forma de assegurar a mantença de seus objetivos.

Detratar a imagem de opositores, exacerbando seus defeitos e minimizando seus méritos, em discursos construídos propositalmente com a utilização de formas falaciosas relevantes, sejam com a utilização de um Argumentun  ad Hominen (ofensivo), que desqualifica o opositor, ou mesmo o Argumentos ad Baculum (recurso à força), quando se apela para a força ou à ameaça de força para provocar a aceitação de uma conclusão ou, ainda, o Argumentum ad Ignorantiam (argumento de que devem existir fantasmas), como aqueles nos quais se amparam as mais diversas crenças e religiões que, mesmo sem poderem ser comprovadas, para justificar padrões de comportamento ou reeditar a história, alterando a realidade dos fatos, são recursos cotidianos usados por quase todos aqueles que estão no poder ou por aqueles que almejam alcançá-lo, invariavelmente valendo-se do pouco conhecimento e preparo daqueles que os ouvem.


A falta ou a incapacidade de evidenciar um pensamento crítico, referendada pela lei do menor esforço, que delega a outros a tarefa de “pensar” por nós, historicamente tem sido um importante aliado das ideologias e amplamente utilizado pelos mais diversos veículos de comunicação de massas. De Goebbels a Assis Chateaubriand, onde quer que estejam as reminiscências de seus átomos (no Tártaro espero eu) que o digam.


Haja visto as divergências provocadas pelo futebol, cujas paixões extrapolam o senso da lógica, provocando inimizades entre aqueles que, quando crianças descalças, ora jogavam no lado A, ora no lado B, quase pelados nas peladas de rua, cujo regra principal era o “vira seis, acaba 12”.


Igual exemplo, poderíamos encontrar entre cristãos, onde evangélicos radicais menosprezam católicos como sendo adoradores de estátuas, ou católicos que depreciativamente classificam evangélicos como “leitores de bíblia”, ambos se esquecendo que defendem o mesmo fantasma, cuja mensagem não chegaram a compreender (Argumentun ad Misericordiam [apelo à piedade]) ou um Argumentum ad Populum [apelo emocional]).


Alguns, chegam ao absurdo de até chamar o Papa de comunista, sem sequer imaginar quais seriam as atribuições papais ou mesmo o que é o comunismo, este último, definido como uma proposta política em permanente construção, e que é desconhecida tanto pela grande maioria daqueles que a difamam quanto, igualmente daqueles que a defendem.


Pasmem, alguns chegam a defender que a Terra é Plana e o centro do Universo, outros que os homens foram soberbamente construídos à imagem de Deus, um Ser isento de defeitos, misericordioso e eterno, como se tivessem a menor condição de opinar sobre isso, o que já defendia Santo Anselmo de Cantuária, quando afirmou, em seu Proslógio, que “Deus está acima de tudo aquilo que pode ser pensado ou dito”.


Posições que já foram defendidas (e algumas ainda são), por proeminentes homens de ciência.


Não é, portanto, sem motivo, que a educação formal, principalmente nas áreas das humanidades, dada sua função crítica e emancipadora, sempre foi tão combatida pelos governantes, independentemente de seu viés ideológico, já que todos eles se preocupam apenas com o usufruto vitalício do poder.


Assim, neste sábado de Aleluia, finalizando este breve texto, elaborado como arremedo de um pequeno opúsculo, gostaria de lembrar a importante mensagem de um velho professor, um sujeito baixinho na estatura mas gigante no saber, com o qual tive a oportunidade de conversar por mais de uma vez, nosso patrono da educação Paulo Freire, para quem, a verdadeira autonomia e liberdade só poderiam ser alcançadas através do conhecimento crítico, que eu completaria com uma frase que costumo repetir para aterrorizar aos que momentaneamente se arvoram detentores o poder e que fazem o possível para negar seus ensinamentos:


- Podemos ensinar uma pessoa a pensar, mas depois será impossível fazer com que ela deixe de pensar !


Professor Orosco

TEMPESTADE DE AREIA


Uma das características do Necropoder que pode ser observada neste século XXI, implantado e incentivado por um capitalismo globalizado, que visa apenas a acumulação infinita, é a fragmentação do Estado (outrora Nação) em minúsculos territórios comandados por milícias ou facções de toda ordem.

Diante da incapacidade do Estado, que teima em ser mínimo, mas não abre mão dos custos máximos, ao não oferecer as mínimas condições de segurança, habitação, saneamento, saúde e até o mais importante, uma educação de qualidade, a precarização das comunidades urbanas (leia-se favelas) só faz  fragmentar os nichos populacionais dando margem ao surgimento da violência, só contida por lideranças locais.

Assim, os Antigos Estados Nação, do século XVI, reduzidos a países no século XIX, que passaram a ser apenas Estados lá pelo meio do século XX e apenas municípios no despertar do século XXI, veem-se agora reduzidos a guetos, morros ou zonas cardeais que, dentro de um mesmo município, tem regras próprias, leis próprias, costumes e até uma língua própria, distinta da oficial e que é ensinada nas ruas, sob a égide de um governo não eleito e sustentado pelas armas e pelo terror associado a elas.

Em um Estado onde os representantes não representam, onde a corrupção campeia, onde o trabalho é pouco e a miséria é muita, o futuro dos jovens não está mais na Academia, está na biqueira e na oportunidade de ascensão profissional que ela oferece àqueles que almejam um futuro imediato, já que sabidamente a vida será curta.

Neste terreno erodido, pelo mundo afora, a sociedade se desintegra, varrida pelas sucessivas tempestades de areia, ocorram elas na interminável guerra da Síria (onde areia não falta) no Afeganistão, na Palestina, na Somália, em Atlanta, capital da Geórgia americana (a outra, a soviética, nem existe mais) ou nos morros do Rio (a outrora cidade maravilhosa). 

Ainda poderíamos dizer o mesmo,  sobre os bairros da zona norte paulistana, cuja língua é diferente da zona zul e onde a ZL sequer imagina o que é zona oeste.

A Síria de hoje, me faz repensar a história de Jerusalém, nos tempos das Cruzadas e de Saladino, que a libertou dos libertadores cristãos, quando disse que estrategicamente, em termos militares, aquela cidade cercada de areia, não valia nada, mas valia tudo.

Hoje vivemos em uma sociedade que de sólida passou a fluída e que agora é levada pela vento e pela areia que se move sem sentido, como as dunas do nordeste que, movendo-se soterram cidades e sonhos.

Nem o passado sobrevive a ela.

Como no caso dos beduínos do deserto, nômades vitimados até pelo canibalismo, a estas tribos novas tribos urbanas só  restaram para comer, os gafanhotos ou, na sua ausência, as próprias baratas.

Talvez isso explique a fixação pelas tempestades de areia comuns em Marte, que se mostra aparentemente mais habitável para uma camada mais abastada de nossa gente, que ainda sonha mudar pra lá levando consigo todas as criptomoedas que conseguiram  manter armazenadas no cyber espaço.

Triste ocaso para uma espécie que veio do pó e que a ele deseja voltar.


Professor Orosco.

sábado, 2 de janeiro de 2021

OS CAMINHOS DA GUERRA


No período que antecedeu o maior flagelo da humanidade, a Segunda Grande Guerra Mundial, a Alemanha, que estava sofrendo as consequências da insanidade da Primeira Grande Guerra onde, além da perda de suas colônias e fontes externas de renda, ou da condenação que a obrigou a pagar vultosas indenizações aos vencedores, também estava limitada em seu expansionismo militar, proibida de manter um efetivo de seu exército, maior que poucos milhares de soldados.

Hitler, como um hábil político populista, numa clara opção fascista de extrema direita, acostumado a mentir e a propalar ideias que soavam boas aos ouvidos de uma massa espoliada, valendo-se da soberba dos vencedores, logrou, de pronto, estabelecer uma profissionalização de suas forças armadas, capacitando e transformando o número limitado de soldados que tinha, em oficiais de baixa patente, capazes de rapidamente assumir o controle de um efetivo infinitamente maior. E dizer, ao invés de manter um exército com milhares de soldados, ele criou um exército com milhares de sargentos e tenentes, aptos a organizar a máquina do III Reich.

Paralelamente a esta capacitação, através de acordos espúrios com a Inglaterra e com  uma expressiva camada da oligarquia remanescente na Europa que incluía, inclusive, muitos judeus, conseguiu os recursos que precisava para equipar “secretamente” a maior máquina de guerra vista até então.

Foram centenas de navios e submarinos, milhares de aviões e tanques, os famosos “Panzer” (uma abreviação de "Panzerkampfwagen", um substantivo da língua alemã que se pode traduzir como "veículo blindado de combate"), uma quantidade incalculável de obuses e de uma reserva estratégica de combustível que, inclusive, previa a construção de imensos depósitos de armas e combustíveis, espalhados por toda a África do Norte.

Paralelamente, a indústria de insumos para a guerra, tais como rações, uniformes, botinas, cantis, capacetes e uma infinidade de armas leves, tipo a famosa pistola Luger, foi capaz de empregar a população civil, desempregada.

Assim, sem que o mundo percebesse, ou quisesse perceber, Hitler pôs em marcha um plano de tomada do poder, consolidada por um regime totalitário onde vigorava o mais absoluto terror.

Até aqui, pura retórica histórica, mas que, se desejamos extrapolar, também poderia ser aplicada à Itália de Mussolini, às pretensões imperiais do Japão de Hiroito ou mesmo à megalomaníaca visão de Stalin, uma condição que, se observada agora, no momento atual, também poderia ser compreendida, aqui no Brasil.

Um país fragilizado por um gigantesco descrédito nas instituições democráticas, consequência de uma educação medíocre e de uma corrupção endêmica que, durante dezenas e dezenas de anos, só fez aumentar as desigualdades e alimentar uma pseudo-oligarquia, emburrecida e alimentada por um desejo de ostentação, ora eurocêntrica ora norte-americana, transformado em um ambiente propício para propostas populistas, capazes de eleger, como Hitler foi eleito, um ser abjeto, incapaz de engraxar suas botas, como este que ocupa atualmente um certo palácio e que é endeusado por reminiscências de uma monarquia falida.

Um país, incapacitado de comprar vacinas, mas que investe na compra de tanques, de submarinos, de novas plataformas nucleares ou de satélites de monitoramento, que podem servir para tudo, menos para o objetivo que foi divulgado e onde uma população imbecilizada e sofrendo as consequências de uma pandemia que já ceifou centenas de milhares de vidas, começa a se mostrar desejosa de um regime de exceção, ainda que controlado por milicias, capaz de trazer ordem sobre o caos; onde a censura da imprensa e da proliferação de “fake-news” através das redes sociais se transformaram no único meio de difundir a notícia crível sobre os fatos, em uma escala que faria Goebbels ser comparado a um principiante; que já começa a mostrar os mesmos sinais de xenofobia e de intolerância religiosa, vistos na Europa do início do século passado, igualmente alimentado e incentivado por uma extrema direita, de caráter mundial, que deseja pôr fim ao “Estado de Bem Estar Social” e que está assombrada com a sombra de uma China que já não é emergente, mas potência capaz de pôr fim às castas vigentes.

Enfim, um país que, apesar das prosopopeias presidenciais sobre a necessidade de ter pólvora e não de vacinas, para resolver nossos problemas, já pode ter começado a trilhar os caminhos de uma guerra, cujo objetivo será, como a história mostrou, sempre o mesmo, qual seja, a criação de uma nova dinastia governante nas terras tupiniquins.

 Professor Orosco