sábado, 7 de janeiro de 2017

INVESTIGANDO OS GREGOS

  
A música de qualidade mais inferior produz entre os povos bárbaros sensações incomparavelmente mais fortes do que as provocadas pela mais doce das melodias entre os povos civilizados. Quanto mais os gregos quiseram aperfeiçoar a música, mais viram suas maravilhas enfraquecerem. Isso ocorreu precisamente porque eles desejaram aperfeiçoar a música. Isto é, a estavam julgando. Tudo o que seus selvagens ancestrais haviam feito tinha sido escutá-la. (M. de Pauw [1], Recherches sur les Grecs, 1768)

Este argumento defendido por Pauw, a quase 250 anos atrás, é ainda tido por muitos como verdadeiro, principalmente quando não compreendemos o significado das atuais preferencias musicais de boa parte de nossa juventude.
Se realizarmos um estudo antropológico destas novas tribos urbanas, a partir de seus gostos musicais, poderíamos evidenciar, por exemplo, alguns preconceitos de nossa parte para com elas, quando não percebemos o fato de que a harmonia melódica que defendemos é simplesmente um processo de racionalização (matematização) construída ao longo dos tempos, inspirada em boa parte na observação que fizemos das coisas da natureza, responsável por todo o nosso processo civilizatório.
O jovem, como o bárbaro das civilizações antigas, tendo uma imaginação dominante, é capaz de justificar para si a violência e o desejo de conquista territorial ou de poder, como força motriz do desenvolvimento humano, elementos que Nietzsche explorou muito bem ao definir sua “vontade de potência”. Já os mais velhos, conscientes de sua finitude, veem seus interesses serem pautados por coisas mais próximas a eles, preferindo valorar a razão, a paz e o comércio ao uso da força que já não possuem.
Assim, refutando uma análise simplista do pensamento de Pauw, entendemos que o entusiasmo e o conhecimento, de forma complementar e não antagônica, fazem parte do processo de desenvolvimento humano, tanto individual quanto coletivamente. Ambos são igualmente importantes ou potencialmente perigosos para a continuidade e desenvolvimento da nossa espécie.
A música, ou a forma como ela nos toca, simplesmente espelha isso.

Professor Orosco



[1] Cornélius Franciscus de Pauw, ou Cornelis de Pauw (1739-1799) foi um holandês filósofo, geógrafo, especialista em estudos etnonógicos e diplomata na corte de Frederico, o Grande, da Prússia, Familar às ideias do iluminismo, foi considerado o maior especialista sobre as Américas, mesmo nunca tendo visitado o continente. Também escreveu sobre as origens dos povos antigos, rejeitando a ideia popular de que a China havia sido, originalmente, uma colônia do Egito Antigo.