Praticamente
desde o período em que o macaco antropomorfo desceu das árvores, vendo seu rabo
atrofiar-se, assumindo uma postura ereta e passando a caminhar sobre seus
próprios pés, nossa espécie passou a questionar o seu mundo circundante e, ao
fazê-lo, questionar-se a si mesma. O que somos nós? De onde viemos? Para aonde
vamos? Qual o significado desta nossa existência?
Juntamente
com estas questões, outras, de caráter fenomenológico começaram a ocupar essas mentes
incipientes que procuravam respostas e que esboçavam explicações empíricas e
simplistas para tudo o que estava ao seu redor. Assim, a noite que surgia quando o astro Rei ia deitar-se, trazia
consigo as centelhas do braseiro celeste, iluminando o firmamento, tal quais as
chispas lançadas ao vento no crepitar das chamas de uma fogueira provocada por
um raio na mata. A Lua, enamorada do Sol, sempre a persegui-lo, velava
zelosamente o seu repouso, mostrando-nos que ao redor da terra plana em que
vivíamos, girava todo o universo conhecido e onde, algumas vezes ela quase o
alcançava, tornando-se quente e brilhante e, em outras vezes, deixando-o
distanciar-se, tornava-se fria e chorosa. Por sua vez, acompanhando seus
humores, a terra bruta, obedecendo ao bom senso, ora nos oferecia frutos
abundantes, ora nos oferecia troncos desnudos e secos.
Da
repetição cíclica destes humores, com as consequentes implicações sobre as
pulsões de nossa espécie, sempre ávida por mais potência, em cujo caminhar, num
movimento de descida da “árvore de Porfírio” começamos a particularizar as
perguntas, alcançando próximo de suas raízes as célebres questões “o que é
isto?” e “quem ou o que é aquele que pergunta o que é isto?”, passamos a
nominar o sujeito e a predicar-lhe atributos, permitindo, assim, o desabrochar
da subjetividade manifesta em cada indivíduo.
Com
tantas perguntas e tão poucas respostas, a aceitação niilista de uma coisa
criada que foi promovida a criadora, alcançou, finalmente, em um mundo
suprassensível, inteligível, idealizado, um significado de “verdade absoluta”,
não sendo mais necessária, a partir de então, novas relações carnais conosco
para a produção de outros heróis, já que, segundo a sua vontade, tudo, a partir
dela, estava determinado e, portanto, justificado.
Esta
metafísica hegeliana da subjetividade incondicionada da vontade que sabe a si
mesma, isto é, do espírito, onde o modo de ser da incondicionalidade
determina-se para ele a partir da essência da razão que é em si e por si, nunca
no sentido de um “racionalismo” segundo Heidegger, ganhou em Nietzsche, o
último dos metafísicos, um adjetivo suplementar, o da vontade de potência, onde
a subjetividade é incondicionada como subjetividade do corpo, isto é, das
pulsões e dos afetos. Isto não significa, contudo, ainda segundo Heidegger, que
este discurso sobre o fim da metafísica implique em que no futuro não viverão
mais homens que pensem metafisicamente ou que produzam “sistemas ligados à
metafísica”, ou ainda que a própria humanidade não viverá mais sobre uma base
metafísica, mas sim que este fim precisa ser pensado em formas moduladas, transformadoras,
onde um mundo do saber será novamente construído.
E
dizer, apesar do fato de que tanto a religião ou a razão não terem nos fornecido
até hoje todas as respostas, levando-nos a um perigoso estado psicológico de
experimentar coletivamente um niilismo passivo, um certo retorno às origens,
como um bom caldo de galinha ou de uma preventiva benzedeira do quebrante, por
ora não fazem mal a ninguém, ou seja, apesar de místico, falso ou insuficiente,
esta vivência mimética da realidade em nossa condição animal, que ouve e age livremente
em função de suas pulsões, até que alcancemos um novo patamar do nosso
desenvolvimento enquanto espécie, ainda é um importante instrumento de coalizão
social que garante a sobrevivência humana.
Professor Orosco
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