sexta-feira, 29 de março de 2013

A TEOGONIA DOS SÉCULOS XX E XXI



            Após as revoluções protestantes do século XVI, a figura endeusada do “Papa” foi duramente questionada, abrindo-se uma vacância no panteão vigente à época.
            Após as revoluções americana e francesa do século XVIII, a figura divina do imperador, assim como outrora, a figura dos Faraós, foi reduzida à mortalidade e à falibilidade.
            A população mundial, que aprendia a ler, vítima do iluminismo que lhe abria os olhos, mesmo diante da dor provocada pelo conhecimento, refém de seus alicerces morais, patriarcal em sua essência, via ruir também estas colunas em consequencia dos teares e da máquina a vapor.
            Como uma criança recém desmamada que se separa da mãe, sentindo-se perdida na imensidão da calçada inexplorada, a massa humana, agora emancipada, movia-se em busca de uma mão, adulta, que a pudesse amparar.
            Como a caminho a ser percorrido era incerto, desconhecido, ameaçador, o ponto de referencia passou a ser, não aonde se podia chegar, mas o portão da casa para onde não se queria voltar.
            Dadas às características geográficas, à condição heterogênea das várias tribos humanas, tanto econômica quanto cultural, as escolhas sobre o caminho a ser seguido foram igualmente diferentes.
            Monarquias absolutistas, como no Japão; constitucionalistas, como na Inglaterra e na Alemanha; clericais, como no Islã; repúblicas como na França e nos Estados Unidos, foram alguns dos modelos adotados.
            Nas sucessivas revoluções e contra revoluções, o mais importante para a manutenção do poder, oligárquico em sua essência, pelos governantes do momento, foi associar o retorno à figura de um inimigo do povo.
            Demonizar pessoas, grupos de pessoas, sistemas políticos, formas de pensamento, crenças religiosas, etc., foi a estratégia comum que se pode observar ter sido construída ao longo do século XIX.
            Eleger o Capital como inimigo do proletário, a religião como ópio do povo, a metafísica como antinomia do positivismo comteano, o cristão como inimigo do Islã, assim como o islamismo classificado como inimigo do povo judaico, foram formas de consolidar fronteiras do pensamento, travestidas em nações separadas por rios e mares.
            Influenciadas por necessidades práticas para seu desenvolvimento, tal qual a criança perdida na calçada da rua onde ficava sua casa, as populações passaram a dar ouvidos a todo e a qualquer novo sofista que, apontando um novo caminho, dispunha-se a conduzir a sua nova manada.
            Durante todo o século XX, vimos surgir e desaparecer muitos destes deuses.
            Bismarck, Lênin, Stalin, Trotsky, Ted e Franklin Roosevelt, Truman, Churchil, De Gaule, Hiroito, até Getúlio na primeira metade do século, marcado a fogo por figuras como “il Duce”, Hitler e seus opostos Gandhi ou Elisabeth.
            No despertar da era atômica, novas correntes filosóficas, novos questionadores, novos deuses.
            Com a globalização, o deus “Dólar” e seus seguidores, Kennedy, Nixon, Bush e Oba-Oba.
            Antepondo-se a eles, Mao Mao, Khomeini, Sadan, Bin Laden.
            Na mesma linha populista, Perón, Noriega, Castro, Tchê ( não o nosso gaúcho), o recém falecido Chaves e o imortal Lulla.
            Na era pós Steve Jobs, onde ainda resiste heroicamente o bom senso de um Mandela, vemos ressurgir Francisco, com o mesmo discurso da igreja de alguns séculos atrás.
            Sem mudanças estruturais, que coloquem o homem como sujeito e como objeto a ser trabalhado pela luz do saber, corremos o risco de ver um Kim Jung, da inexpressiva metade norte da Coréia, levar o mundo, ofuscado pelo brilho do seu cetro divino, tal qual a luz refletida pelos escudos polidos que defenderam o povo hebreu, ao penhasco e à destruição.
            Precisamos construir um novo panteão, à luz da verdade e da justiça, as gerações futuras merecem isso.
           
Professor Orosco
           


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