Nietzsche, ao iniciar sua apresentação, alerta
sobre o problema das escolas na Alemanha, de caráter formativo, chamando a
atenção para o fato que não existem propostas colocadas para sua solução.
Coloca que os ouvintes esperam que ele
proponha uma solução, convidando-os a dividir consigo, pontos de vista que “ouviu”
de uma conversa sobre o assunto.
Nietzsche coloca a todos os interessados na
resolução do problema, que muitas das respostas já são conhecidas, estando
apenas esquecidas.
Coloca aos ouvintes que, para começar a
compreender o problema, é necessário observar o perfil dos estudantes, que se
mostram, ao mesmo tempo, ávidos por melhorias em um mundo que se apresenta
caótico e, desinteressados pelos modelos vigentes propostos para sua solução.
Coloca também que os alunos, assim como ele
quando jovem, desejam experimentar, colocar suas opiniões e submetê-las às
criticas de seus pares.
Neste ponto, seus comentários trazem à minha
mente o filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, de 1989. Dirigido por Peter Weir e
que teve como protagonistas o professor Keating, interpretado por Robin
Williams, e jovens atores (Robert Sean Leonard, Ethan Hawke e Josh Charles) que
representavam os estudantes.
Nietzsche coloca que este modelo ganhava
comprometimento e envolvimento dos participantes, ainda que de modo informal.
Coloca, também, que este modelo, por sua vez,
já reproduzia o modelo formal de ensino, ao impor regras para sua realização.
Coloca que a alegria do processo consistia
exatamente na irreverência permitida aos participantes, ainda que o ritual para
as reuniões fosse mantido.
Este contato com a natureza (liberto do
espaço tradicional) e o modelo da reunião também permitia espaço para um
processo reflexivo.
Nietzsche coloca a ideia de que a escolha do
lugar para a reunião precisava contemplar o prazer dos estudantes, permitindo-lhes
“relaxar para refletir”.
Nietzsche coloca que, para
direcionar o trabalho reflexivo dos alunos, antes, tornava-se necessário
oferecer-lhes um alvo, metaforicamente simbolizado pelo carvalho caído (modelo
formal de ensino) contra o qual devem dirigir suas críticas, reconhecendo, de
antemão, que o sistema vigente reage contra estas tentativas de mudança.
Nietzsche coloca que esta repressão
se dá muito mais por desconhecimento de causa do que por desejos de manter a
tradição, cujos méritos eles (os conservadores) entendem serem “aceitos por
todos”.
Nietzsche coloca quer esta posição
autoritária desperta, nos estudantes, um movimento de revolta, já que não são
compreendidos em seus anseios.
Alerta para o fato de que esta
revolta manifesta dos estudantes, é entendida (pelos mestres) como “coisas de
crianças” , um problema que o tempo se incumbirá de corrigir.
Os jovens, ao insistirem no seu
caminho rebelde, provocam perplexidade nos defensores do modelo tradicional,
que não conseguem compreender o desejo dos alunos.
Diante do impasse, os mestres que
adotam uma postura consensualista, por sua vez, tendem, por hábito, defender
propostas conservadoras.
Diante da perplexidade dos alunos
que nada veem de equivocado nas suas ações, os consensualistas tentam defender
as posições conservadoras de uma sociedade já estruturada e que não vê com bons
olhos este movimento libertador e revolucionário.
O reconhecimento do temor
revolucionário, por sua vez, só faz reforçar, nos alunos, o desejo por
mudanças.
E, para os alunos, esta insistência
em defesa da formalidade, só reforça sua posição radical por desejo de
mudanças, embora os force a tolerá-la.
Esta tolerância, aceitação forçada
do modelo tradicional, por não encontrar eco entre os alunos, provoca sua
alienação e o seu descomprometimento com a educação formal.
Tal posição faz que, vez ou outra, o
modelo rebelde aflore, ainda que mascarado, já que, para os estudantes, não há
erro.
Por sua vez, estes rompantes juvenis acabam
sendo tolerados pelos conservadores que nada veem de ameaçador, como rompantes,
ao sistema.
Os conservadores, para buscar a aceitação dos
alunos, valem-se da máxima de que, também eles, já foram jovens e alunos.
Aos consensualistas, esta pseudo abertura
concedida aos estudantes, basta por si, e mascara uma ideia conservadora,
dando-lhe um aspecto progressista.
Nesta aparente calma, com os espíritos
desarmados, tenta-se estabelecer um diálogo entre as partes, onde os jovens
apresentam suas dúvidas e temores.
Diante destas dúvidas colocadas, os
conservadores, jocosamente riem-se dos alunos e duvidam de sua capacidade de
compreender o que realmente anseiam, o que provoca decepção e evidencia a
distancia entre as propostas, entre a oferta e a procura.
Diante da inconsistência manifesta pelos
alunos, que “não sabem o que precisam saber” (se soubessem não seriam alunos),
os conservadores insistem na obediência à forma tradicional de ensino, como
maneira de assegurar a transmissão do conhecimento, dando ao tempo a tarefa de
fazer-se compreender.
Estabelecida a trégua, o caminho dicotômico
se coloca a ambos e, travestido de aparente calmaria, nada, de fato, pode considerar-se
que foi aprendido pelas partes, que seguem propostas separadas, sem uma síntese
possível.
Este caminho particular, alienado e
desconectado do conjunto formal de saberes, acaba por consolidar, nos alunos, a
exclusão e a negação do acesso aos conhecimentos que lhes seria devido.
Nesta liberdade acadêmica, defendida pelos
estudantes, onde nada do que é solicitado pela sociedade organizada e formal é
aprendido ou ensinado, a sensação de realização torna-se presente e
institui-se, formalmente, a alienação do estudante no mundo real.
Diante da realidade imposta pelo mundo,
apresenta-se, então, ao aluno, de forma inconteste, a necessidade do
conhecimento formal, técnico, despertando tardiamente nele, o desejo de
aprender.
Pouco, dentre muitos, realmente alcançarão
este estágio, sentindo-se frustrados e lamentando-se pelos anos perdidos, onde
as oportunidades de obter o conhecimento necessário para a sua
profissionalização, a técnica, passaram ao largo, evidenciando a fria realidade
do mercado, onde só alguns privilegiados alcançam o sucesso.
É esta descoberta que desnuda a real intenção
do sistema educacional que, travestido de democrático e pluralista, na verdade
só faz reproduzir e consolidar as desigualdades entre os homens.
Neste ponto, faz-se mister repassar
a posição defendida por Pierre Bourdieu sobre “o papel da escola na reprodução
e legitimação das desigualdades sociais”, conforme artigo que publiquei em meu
blog aos 27 de julho de 2013.
É esta descoberta que revela e
indica o longo e árduo caminho necessário para alcançar o conhecimento,
explicando em parte, o porquê de muitos alunos preferirem recostar-se à sombra
de uma árvore do que caminhar pelo escaldante Sol do saber.
Humildemente o estudante,
reconhecendo sua presunção, reconhecendo a necessidade de uma educação formal,
coloca aos mestres que o motivo de seu pouco interesse se devia aos modelos
propostos pela educação formal, que ele define como “tendência à extensão” e a “tendência
à redução”, ambas, aparentemente opostas, ampliando ou reduzindo a própria
cultura, buscando suas ambições mais elevadas ou abandonando-as e submetendo-a
a interesses menores, do Estado, por exemplo.
A extensão entendida como
promotora de uma cultura utilitarista que visa colocar o homem a serviço do
modelo econômico vigente, capacitando-o tão e somente o necessário para que
possa alcançar o sucesso num mundo cada vez mais competitivo, onde, nesta
proposta, os conceitos que visem promover a introspecção e a reflexão sobre
temas não ligados ao seu desenvolvimento profissional são suprimidos do processo
educacional e, de certa forma, proibidos.
Neste ponto, o próprio modelo
formal reconhece que a massificação da cultura tem um caráter inversamente
proporcional à sua qualidade, enquanto cultura, e o faz, atendendo aos
interesses de uma sociedade cada vez mais competitiva.
- Se todos forem médicos,
advogados, cientistas ou engenheiros, quem plantará as batatas?
Percebe-se também que, a extensão
e a ampliação da cultura a todos por seu caráter generalista prestam-se, em
alguns países, a defender uma postura laica da educação, afastando-a de valores
religiosos; em outros, esta extensão é utilizada como instrumento de manutenção
de um Estado que precisa mostrar-se mais forte. não aceitando as críticas advindas
de uma minoria realmente instruída.
Esta extensão da cultura, que
promove a especialização e a particularização do conhecimento, servindo como
mantenedora de uma sociedade consumista, acaba, ao final, reduzindo os “educandos”
a meros operários especializados em funções laborais específicas e promovendo,
neles, a alienação política que interessa ao sistema.
Em suma, a extensão e a ampliação
da cultura, oferecida nas escolas formais, que produzem especialistas, acaba
submetendo, como consequência direta desta proposta, a ciência e o conhecimento
aos interesses do mercado.
Acaba, por fim, associada a um caráter
informativo e jornalístico, adotando uma linguagem de massas, distanciando-se
do erudito e do clássico, da cultura propriamente dita, formando uma “pseudocultura”
que impede o desabrochar do verdadeiro pensamento crítico.
Diante de tais colocações, os
próprios educadores, ainda que conservadores, frente aos resultados observados
no desenvolvimento dos alunos, acabam por render-se às evidências.
Professor
Orosco.
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