“A matemática é o alfabeto com o qual Deus escreveu o Universo”
Galileu Galilei (1564/1642)
Renê
Descartes (1596/1650), matemático francês, considerado o fundador da filosofia
moderna, durante uma trégua na guerra dos 30 anos, que envolvia a maioria dos
países europeus, recolhido ao quarto de uma hospedaria para dormir, sentindo-se
privado das companhias agradáveis que a folga lhe proporcionava nas “noites
sempre mal dormidas das cidades alemãs da época” (conforme seu Discurso do
Método, Segunda Parte), iluminado, quiçá, pelo brilho tênue da candeia,
pondo-se a refletir sobre o que
aprendera ainda jovem, comparando este aprendizado com as experiências vividas
na guerra, pôs-se a duvidar das coisas.
Esta
dúvida, que se tornou metódica, já que envolvia a decisão de duvidar; que se
tornou hiperbólica (exagerada) fê-lo renunciar a praticamente tudo o que não se
apresentasse como indubitavelmente verdadeiro.
Ele
percebeu que os sentidos, porta de entrada do conhecimento empírico para o
intelecto, não eram seguros, e que, por serem falhos, podiam nos induzir ao
erro.
Sendo
coerente com sua dúvida, viu-se obrigado a rejeitar o mundo sensível, o próprio
corpo, não os declarando falsos, mas aceitando-os como possibilidade contingente,
o que não os colocava como indubitavelmente verdadeiros.
Afinal,
segundo ele, poderia estar sonhando.
Sonhando,
imaginar que via, que tocava, que sentia.
Para
ele, nosso corpo, portanto, não podia ser tomado como princípio para encontrar
a verdade, já que só se podia tomar por verdadeiro aquilo do qual não pudesse
haver dúvida.
A
própria dor que se sente, não se pode dizer que é por causa da ferroada da
abelha, mas assemelhada à provocada por ela.
Era,
portanto, preciso ir além.
Além
do corpo, além dos sentidos, para tentar alcançar o verdadeiro.
Chegou
à conclusão que, mesmo em sonho, a extensão seria real (não é possível imaginar
uma sala que não tenha largura, comprimento e altura), e que, portanto, as
matemáticas seriam verdadeiras, e dizer: 2 + 2 seriam 4, assim como um
triangulo teria, em qualquer situação, 3 lados.
Mas,
sua dúvida precisava ser radical, hiperbólica, de modo que a verdade se
tornasse inquestionável.
Esta
matemática, que se tomava por verdadeira, em outro universo possível, poderia
não sê-lo.
As
regras da física, que aprendemos serem validas aqui, com a ação de um “Deus
Enganador”, em outra realidade, poderiam não ser aplicadas.
Isto,
embora parecendo absurdo, da mesma forma que a não existência do corpo, não
podia ser classificado como impossibilidade e, como tal, para Descartes, a
própria extensão, as matemáticas, não podiam mais ser tomadas por princípios
verdadeiros, indubitavelmente aceitos.
E
pior, este “Deus Enganador”, poderia ser um “Gênio Maligno”, cujo principal
diversão seria nos enganar.
Esta
dúvida, em sua afirmativa, acabou se transformando na primeira das verdades
para Descartes.
Se
existe um Deus Enganador, um Gênio Maligno, que tenta nos enganar, é prova de
que existimos.
Quanto
mais ele tentar nos enganar, mais certeza teremos de que existimos.
Ergo
Sum => Res Existens (Coisa que existe)
Mas,
conforme as dúvidas anteriores, ainda não podemos dizer que existimos de forma
corpórea e, por ora,a única certeza à qual ele pode chegar, é a de que
existimos enquanto pensamento.
Descartes
chega, assim, à grande descoberta do Cógito.
“Penso,
logo existo” => Res Cogitans (coisa que pensa)
Pensamos
porque existimos e, só existimos enquanto pensamos.
Não
se poderia, ainda, para ele, ter a garantia de que, enquanto dormimos,
continuamos a existir.
Esta
dúvida, hiperbólica, levou Descartes a profundas reflexões sobre o pensamento.
Na
tentativa de superar o solipsismo, o mundo resumido ao seu eu, onde o sujeito
não consegue ir além de si mesmo, para recuperar o mundo que havia perdido
junto com seu corpo, Descartes, partindo do pensamento, encontra outra verdade,
que lhe permite ir além.
Ele
conseguiu conceber a ideia de perfeição.
Uma
perfeição que viria de si, ou que viria de fora de si.
Entendendo-se
como imperfeito, já que duvida e que não tem todas as respostas, que não
consegue saber o que é falso e o que é verdadeiro, fica, portanto, evidente
para ele, que a perfeição só pode estar fora, além do sujeito.
Estudioso
de Aquino e de Aristóteles, compreendendo que uma causa transfere algo de si
para o efeito e, ao fazê-lo, evidencia uma perfeição maior do que aquela
percebida no efeito, ele acaba concluindo que, se a perfeição não está em nós,
que a percebemos e da qual participamos, está em algo que é perfeito, algo que
é imutável, indubitável, eterno.
Descartes
acaba, assim, por aceitar Deus, como verdadeiro.
Deus
=> Res Infinita.
Como
verdadeiro e perfeito, Deus é o sumo bem, e como tal, não nos engana.
Assim,
para ele, como Deus não nos engana, não podem existir outros universos
paralelos em que as matemáticas sejam outras, e com esta certeza, Descartes
recupera a ideia de extensão e com ela as matemáticas, assim como a certeza de
que é devido a ele a garantia de nossa vigília enquanto dormimos.
Para
ele, Galileu, afinal, estava certo.
Professor Orosco
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