sexta-feira, 25 de abril de 2014

DA GALILÉIA A GALILEU SEGUNDO DESCARTES


“A matemática é o alfabeto com o qual Deus escreveu o Universo”
                                                                                                 Galileu Galilei (1564/1642)

            Renê Descartes (1596/1650), matemático francês, considerado o fundador da filosofia moderna, durante uma trégua na guerra dos 30 anos, que envolvia a maioria dos países europeus, recolhido ao quarto de uma hospedaria para dormir, sentindo-se privado das companhias agradáveis que a folga lhe proporcionava nas “noites sempre mal dormidas das cidades alemãs da época” (conforme seu Discurso do Método, Segunda Parte), iluminado, quiçá, pelo brilho tênue da candeia, pondo-se a  refletir sobre o que aprendera ainda jovem, comparando este aprendizado com as experiências vividas na guerra, pôs-se a duvidar das coisas.
            Esta dúvida, que se tornou metódica, já que envolvia a decisão de duvidar; que se tornou hiperbólica (exagerada) fê-lo renunciar a praticamente tudo o que não se apresentasse como indubitavelmente verdadeiro.
            Ele percebeu que os sentidos, porta de entrada do conhecimento empírico para o intelecto, não eram seguros, e que, por serem falhos, podiam nos induzir ao erro.
            Sendo coerente com sua dúvida, viu-se obrigado a rejeitar o mundo sensível, o próprio corpo, não os declarando falsos, mas aceitando-os como possibilidade contingente, o que não os colocava como indubitavelmente verdadeiros.
            Afinal, segundo ele, poderia estar sonhando.
            Sonhando, imaginar que via, que tocava, que sentia.
            Para ele, nosso corpo, portanto, não podia ser tomado como princípio para encontrar a verdade, já que só se podia tomar por verdadeiro aquilo do qual não pudesse haver dúvida.
            A própria dor que se sente, não se pode dizer que é por causa da ferroada da abelha, mas assemelhada à provocada por ela.
            Era, portanto, preciso ir além.
            Além do corpo, além dos sentidos, para tentar alcançar o verdadeiro.
            Chegou à conclusão que, mesmo em sonho, a extensão seria real (não é possível imaginar uma sala que não tenha largura, comprimento e altura), e que, portanto, as matemáticas seriam verdadeiras, e dizer: 2 + 2 seriam 4, assim como um triangulo teria, em qualquer situação, 3 lados.
            Mas, sua dúvida precisava ser radical, hiperbólica, de modo que a verdade se tornasse inquestionável.
            Esta matemática, que se tomava por verdadeira, em outro universo possível, poderia não sê-lo.
            As regras da física, que aprendemos serem validas aqui, com a ação de um “Deus Enganador”, em outra realidade, poderiam não ser aplicadas.
            Isto, embora parecendo absurdo, da mesma forma que a não existência do corpo, não podia ser classificado como impossibilidade e, como tal, para Descartes, a própria extensão, as matemáticas, não podiam mais ser tomadas por princípios verdadeiros, indubitavelmente aceitos.
            E pior, este “Deus Enganador”, poderia ser um “Gênio Maligno”, cujo principal diversão seria nos enganar.
            Esta dúvida, em sua afirmativa, acabou se transformando na primeira das verdades para Descartes.
            Se existe um Deus Enganador, um Gênio Maligno, que tenta nos enganar, é prova de que existimos.
            Quanto mais ele tentar nos enganar, mais certeza teremos de que existimos.
            Ergo Sum => Res Existens (Coisa que existe)
            Mas, conforme as dúvidas anteriores, ainda não podemos dizer que existimos de forma corpórea e, por ora,a única certeza à qual ele pode chegar, é a de que existimos enquanto pensamento.
            Descartes chega, assim, à grande descoberta do Cógito.
            “Penso, logo existo” => Res Cogitans (coisa que pensa)
            Pensamos porque existimos e, só existimos enquanto pensamos.
            Não se poderia, ainda, para ele, ter a garantia de que, enquanto dormimos, continuamos a existir.
            Esta dúvida, hiperbólica, levou Descartes a profundas reflexões sobre o pensamento.
            Na tentativa de superar o solipsismo, o mundo resumido ao seu eu, onde o sujeito não consegue ir além de si mesmo, para recuperar o mundo que havia perdido junto com seu corpo, Descartes, partindo do pensamento, encontra outra verdade, que lhe permite ir além.
            Ele conseguiu conceber a ideia de perfeição.
            Uma perfeição que viria de si, ou que viria de fora de si.
            Entendendo-se como imperfeito, já que duvida e que não tem todas as respostas, que não consegue saber o que é falso e o que é verdadeiro, fica, portanto, evidente para ele, que a perfeição só pode estar fora, além do sujeito.
            Estudioso de Aquino e de Aristóteles, compreendendo que uma causa transfere algo de si para o efeito e, ao fazê-lo, evidencia uma perfeição maior do que aquela percebida no efeito, ele acaba concluindo que, se a perfeição não está em nós, que a percebemos e da qual participamos, está em algo que é perfeito, algo que é imutável, indubitável, eterno.
            Descartes acaba, assim, por aceitar Deus, como verdadeiro.
            Deus => Res Infinita.
            Como verdadeiro e perfeito, Deus é o sumo bem, e como tal, não nos engana.
            Assim, para ele, como Deus não nos engana, não podem existir outros universos paralelos em que as matemáticas sejam outras, e com esta certeza, Descartes recupera a ideia de extensão e com ela as matemáticas, assim como a certeza de que é devido a ele a garantia de nossa vigília enquanto dormimos.
            Para ele, Galileu, afinal, estava certo.

Professor Orosco
           
           
           

            

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