O Daisen, o ser existente, de Hegel, em sua
obra Fenomenologia do Espírito, desenvolve-se como uma consciência em si (bewusstsein
selbst), que através da história, alcança a consciência de si
(selbstbewusstsein), percebendo-se conectado ao Geist (espírito) cósmico, ou
Deus.
Isto em uma lógica que não
tem consciência “de si” (selbst).
Mas que tem consciência “em
si” (an sich)
Em
uma razão (Vernunft) que, à medida que adquire consciência “de si” (pela história)
evolui para uma consciência “para si” (für sich).
Em uma consciência para si
que se traduz no Conceito (Begriff).
Esta
plena consciência de si, contida no conceito, é, para Hegel, o fim da história.
Para
ele, a abstração (teoria) era o distanciamento do ser e o conceito era o
encontro com o ser.
Como em todo o particular (das bensodere), para
Hegel, o ser em si, só pode existir mediante seu reconhecimento, corporizado
por outros particulares, cuja somatória total se aproxima do universal.
Em outras palavras, no momento atual,
poderíamos representar esta situação comparando-a com a Internet, a rede
mundial de computadores, que funciona pela somatória de todas as CPU´s
conectadas virtualmente a ela.
Assim, para alcançar a consciência de si, como
não podemos interagir com a imagem do espelho, somos obrigados a interagir com
outros conscientes de si (outras pessoas), e dizer, tomamos consciência do que
não somos e isto nos auxilia a construir aquilo que somos.
Algo como a proposta defendida por Plotino nas
Enéadas.
Plotino entendia a parte inferior da alma como
sendo aquela que exerce as atividades da alma animal, da sensação e do
movimento; da alma vegetativa, que é o crescimento.
A parte central, entendida como racional, que realiza seu discurso interior ou
exterior no tempo, e a parte superior da alma, que exerce a atividade do
pensamento puro, típica do intelecto.
E dizer, como que acompanhando a linha de raciocínio de Aristóteles, Plotino
privilegia uma apresentação hierárquica onde os níveis de realidade descem do
Uno até a matéria, indo do Ser-Intelecto e da Alma aos corpos inanimados, ou
seja, onde o efeito não está separado da causa, estando sempre em seu
princípio.
O “Um”, chamado frequentemente de “Bem”,
“Deus” ou “Primeiro”, é o fundamento de todas as coisas, absolutamente simples
e único, de onde tudo emana e para onde tudo deseja retornar.
O ser humano, enquanto corpo, governado por uma alma provida de funções
superiores (raciocínio e intelecto) ou inferiores (sensitivas e vegetativas) é
verdadeiramente o ponto de encontro dos dois mundos tradicionais de Platão: o
inteligível e o sensível.
Plotino declara que a alma é como um
universo inteligível.
Para
poder tocar o “Um”, a alma deve despojar-se de tudo e abandonar o que
caracteriza a inteligência para perder toda a forma, como objeto para o qual
ela tende.
Para Plotino, ainda que existam muitas almas, todas elas são uma só alma; uma
alma que pode se tornar Intelecto, já que na sua parte superior, ela já é um
intelecto.
Extraído de Artigo Publicado em meu blog
em 12 de Julho de 2013
Hegel corrobora a ideia de que o sensível é
apenas a representação do objeto (sua imagem), que não pode gerar o
conhecimento do ser em si.
Este Geist universal, que ele chama de Absoluto,
como não poderia deixar de ser, é maior que a soma de todas as partes e, aqui
distanciando-se da proposta do cristianismo, Hegel afirma que ele só pode
existir, corporizado nos particulares, também maiores que a soma se suas partes
corpóreas uma vez que, além da alma, eles têm, também, a capacidade de
expressar-se.
Este Geist universal, Absoluto, torna-se,
assim, imortal, pela somatória de todos os processos finitos dos particulares
que o compõem.
Nesta evolução histórica, se começarmos pela
Grécia antiga, que, segundo Hegel, atingiu a unidade mais perfeita entre a
natureza e a mais sublime das formas expressivas humanas, evidencia-se a
necessidade de que esta unidade precisava morrer para que o homem desenvolvesse
a razão rumo ao estágio de auto clareza, essencial para sua realização como ser
radicalmente livre.
“A bela
síntese grega tinha de morrer porque o ser humano necessariamente seria levado
à divisão interior, visando seu crescimento. Em particular o crescimento da
razão e, consequentemente, o da liberdade radical requeriam um rompimento com o
natural e o sensível.
O sacrifício tinha
sido necessário para que o ser humano desenvolvesse ao grau máximo a sua
consciência de si e a sua autodeterminação livre. No entanto embora não
houvesse esperança de retorno, havia esperança de uma síntese mais elevada, uma
vez que o ser humano tivesse desenvolvido plenamente sua razão e as suas
faculdades, síntese na qual ambas, a unidade harmoniosa e a plena consciência de
si, seriam unidas.”
Taylor, Charles. Hegel. São
Paulo: ELD, 2014
Poderíamos, analogamente, associar esta ideia,
não a um círculo perfeito, onde retornamos ao ponto de origem, mas a uma
espiral, como na sequência de Fibonacci, onde o aprendizado pelo crescimento
interior, nos aproximaria do Geist cósmico (Deus).
“Assim,
enquanto a natureza tende a realizar o espírito, isto é, a consciência de si, o
ser humano como ser consciente tende à apreensão da natureza, na qual ele a
verá como espírito e em conformidade com seu próprio espírito.”
Taylor, Charles. Hegel. São Paulo: ELD, 2014
Assim sendo, figurativamente, “O Homem é aquilo
que come!"
Hipócrates, cerca de 460/370 a.C.
Hegel, neste ponto, é refutado por Feuerbach,
que nega o conceito de que exista primeiro a ideia e depois a matéria (a maçã
real precede a ideia de maçã), chegando este, a afirmar, em seus comentários, que
Hegel descreve o homem de ponta-cabeça.
Para Hegel, continuando a evolução histórica,
no mundo romano, o espírito livre do mundo grego, diante das exigências do
Estado, havia sido destruído e o indivíduo só podia encontrar a liberdade
recolhendo-se a si mesmo.
Quando o mundo
natural é implacavelmente contrário a seu anseio por liberdade, como era o
mundo romano, não existe uma saída no âmbito do mundo natural.
SINGER, Peter. Hegel. São Paulo: Loyola,
2012
Segundo Hegel, a religião cristã, assumida
oficialmente como religião do Estado, no ocaso do Império romano, “era especial
porque Jesus Cristo era ao mesmo tempo um ser humano e o filho de Deus”
(SINGER, 2012) o que inferia aos homens a noção de que, embora limitados, eles
também eram feitos à imagem de Deus, levando-os ao desenvolvimento da
“consciência de si religiosa”.
No entanto, para Hegel, este cristianismo
mostrava-se estagnado, decadente, pois padecia da mesma estrutura burocratizada
que o Estado tinha adotado para a administração das coisas públicas.
Isto fez com que ele se distinguisse dos
românticos de seu tempo, que entendiam que a unidade entre a subjetividade e a
natureza foi alcançada por intuição ou imaginação.
Para eles, a razão era vista como uma faculdade
divisora, analítica, que apenas nos distanciava da união com a natureza.
A essa visão da relação do ser humano com Deus,
Hegel contrapõe uma visão alternativa, cuja noção é “destino”, onde aquilo que
sucede a nós fora do nosso poder, o que se nos acomete na história, deveria ser
visto como uma reação que vem sobre nós devido à nossa própria infração contra
a vida.
E dizer, percebendo que a separação em relação
à natureza era essencial, porém inatingível, ele desenvolve uma nova
perspectiva de história como o desdobramento necessário de um certo destino
humano, onde, o crescimento da consciência de si leva o indivíduo a distinguir
a si mesmo, dentro de sua comunidade, desejando a liberdade.
Ou seja, para que esta liberdade se constitua é
necessário que existam condições preestabelecidas para isto, e, dentre elas, a
necessidade de que o ser humano desenvolva uma consciência de si, o que o leva
a tornar-se indivíduo, distinto de sua comunidade, tornando-se o seu próprio
senhor.
Na perspectiva liberal, a liberdade pode ser
compreendida como um conceito onde se pode fazer tudo o que se quer.
Ocorre que, com a oferta de novos produtos e de
novos serviços, este querer se torna infinito e, por isso, a liberdade se torna
inalcançável.
Assim sendo, Hegel vê que o ser humano só
alcança a sua autonomia racional e autoconsciente separando-se da natureza,
repudiando qualquer tentativa de retornar à unidade primitiva e, à medida que
esta consciência racional cresce por si mesma, o seu modo de expressão desta
consciência se altera.
Frente a isto, ele coloca que deve haver uma
hierarquia nestes modos de expressão, onde o superior torne possível um
pensamento mais exato.
Espécies
inferiores de vida ostentam, por assim dizer, protoformas de subjetividade;
porque elas mostram, em grau crescente, propósito, auto conservação como formas
de vida, conhecimento do que as cerca. Em suma, elas se convertem cada vez mais
em agentes e, a exemplo dos animais mais elevados, carecem unicamente do poder
de expressão para serem sujeitos.
Taylor, Charles. Hegel. São
Paulo: ELD, 2014
Hegel admite, porém, que a tarefa de alcançar
este conceito, o Absoluto, pela dialética, esbarra na necessidade física da
razão humana estar presa e condicionada ao indivíduo, finito e com
necessidades.
Em outro contexto, no sistema filosófico de
Hegel, dialético, que provoca a oposição entre o ser humano e o Estado, este
desempenha um papel importante como corporificação do universal na vida humana.
Considerado como muito importante na formação
do indivíduo, para ele, o Estado infere a ideia de que, por pertencer a ele o
indivíduo já está vivendo para além de si mesmo, em alguma vida mais ampla,
assumindo, assim, a posição de “verdade” enquanto expressão da razão universal
na forma da lei.
Por conseguinte, nas suas formas mais
primitivas, o Estado pode estar em oposição ao ser humano, que aspira ser um
indivíduo autoconsciente e livre.
No entanto, para Hegel, o indivíduo deve chegar
a ver a si próprio como o veículo da razão universal e, quando o Estado tiver
chegado ao seu pleno desenvolvimento como corporificação desta razão, então os
dois terão sido reconciliados.
Em sua conclusão, Hegel coloca que o indivíduo
livre não pode realizar a si próprio como indivíduo livre fora do Estado,
porque não pode haver uma vida espiritual descorporificada, e dizer, para ele,
uma liberdade puramente interior é apenas um desejo.
Para Hegel, a liberdade só é real quando
expressa numa forma de vida e, visto que o ser humano não pode viver por si
próprio, necessitando viver em comunidade, o Estado se transforma no modo de
vida coletivo e, por conseguinte, a liberdade tem de ser corporificada a ele.
Esta polêmica posição, como se sabe, acabou
servindo, histórica e equivocadamente, de base para o desenvolvimento dos
regimes totalitários que vimos despontar no século XX.
Professor
Orosco.